Tudo vai bem, senhora Marquesa!

Publicado por Carlos Scheid 20 de março de 2015

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As crianças da França gostam de cantar uma historiazinha nada infantil a respeito das notícias que o mordomo do castelo transmite à Senhora Marquesa. A nobre senhora, ausente há quinze dias, em lazeres na Corte, pede notícias ao servidor que acaba de chegar:

– “Quelles nouvelles?” Que há de novo?

O mordomo responde:

– Tudo vai bem, Senhora Marquesa! Só há um pequeno incidente a deplorar, uma coisinha à toa, uma bobagem: a morte do seu jumento. Fora esse detalhe, tudo vai muito bem…

Claro, a Marquesa quer saber a causa mortis do seu burro cinzento. E eis o valete a explicar:

– Ele pereceu naquele incêndio que destruiu vossos estábulos. Mas, fora isso, tudo vai bem!

É a hora de justificar o incêndio. Como foi isso?

– Nada grave, Marquesa… É que o castelo estava em chamas e o fogo atingiu os estábulos…

– Como assim?! Fogo no castelo?!

– Coisa à toa, Marquesa. Nada demais! Pois não é que o Senhor Marquês resolveu suicidar-se e, ao pendurar-se, derrubou os candelabros, incendiando todo o castelo? Coisinha sem mais importância… E o vento forte espalhou as chamas que atingiram o estábulo, causando a morte do jumento cor de cinza. Fora isso, tudo vai bem, Senhora Marquesa…

* *

Então, tudo vai bem?

Tudo vai bem, diz nossa Marquesa. Problemas? Coisinha à toa. Inflação subindo, água faltando, violência na rua. Umas bobagens. Os cidadãos acuados atrás das grades e do portão eletrônico. Uma correnteza de propina a correr nos oleodutos. Nada demais! Faltam vagas nos presídios. Autoridades revendem as terras da reforma agrária. Licitações e vestibulares fraudados. Nada sério. Tudo vai bem, meu precioso mordomo…

Isto faz lembrar aquela passagem da 1ª Carta aos Tessalonicenses, quando Paulo apóstolo escreve: “Quando todo mundo estiver dizendo: ‘Paz e segurança’, então, de repente, cairá sobre eles a ruína, como as dores da mulher grávida. E não conseguirão escapar”. (1Ts 5,3.)

Alguma coisa me diz que não entendemos a lição de Saint-Exupéry: “Construir a paz é construir o estábulo bastante grande para que todo o rebanho possa ali dormir. É construir o palácio com umas dimensões tais, que todos os homens ali possam caber, sem terem de abandonar seja o que for das bagagens. Não se trata de os amputar para os meter lá dentro. Construir a paz é conseguir que Deus empreste o seu capote de pastor para receber os homens em toda a extensão dos seus desejos. É o que se verifica com a mãe que ama os filhos”. (Cidadela, p.59.)

Agora, sim, tudo vai bem!

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