A Revolução dos Cravos ocorreu em Portugal em 25 de Abril de 1974, completando, agora em 2021, 47 anos. Denominada, inicial e temporariamente, Movimento das Forças Armadas – MFA, foi conduzida pelos Capitães apoiados pelo Partido Comunista Português – PCP, pelo Partido Socialista – PS e pelas comissões de trabalhadores, moradores, soldados.
É denominada Revolução dos Cravos porque a flor cravo foi símbolo marcante nesta revolução. Uma florista chamada Celeste Caieiro passou a distribuir a flor vermelha à população, principalmente moças, que as colocaram nos canos dos fuzis dos soldados. Aos oitenta e tantos anos ela relembra humilde: “Não tinha nada mais para dar a não ser cravos”.
Pela extensão da participação de setores tão diversos é considerada por alguns historiadores como uma das revoluções mais importantes de todo o século XX: uma revolução na metrópole que se dá por força das revoluções nas colônias africanas. É uma revolução democrática que tenta se transformar numa revolução social. Aquilo que começou a 25 de abril, um clássico golpe de Estado ganhou desdobramentos de revolução democrática que tentou se tornar uma revolução social.
A PIDE, temida polícia política tudo controlava, desde a imprensa a movimentos culturais e atividades políticas, mas, em poucas semanas ou mesmo dias, houve a substituição de uma ditadura de 48 anos por um efervescente regime democrático.
Mas o desenvolvimento do processo revolucionário adquiriu cores socialistas, comunistas, social-democratas e maoístas, embora seu resultado seja a democracia liberal no padrão europeu moderno. Um outro ingrediente que aflorou foi a liberdade sexual contra a rigidez hipócrita do catolicismo conservador.
Foram lançadas as bases de outra revolução, pelo avanço nos direitos sociais. Atrás das Forças Armadas entra na história a classe trabalhadora, os setores populares e estudantis. E quando o sujeito social entrou na história, em breve momento, a revolução tentou saltar à frente deste exército e constituir a vanguarda, deixando o Movimento das Forças Armadas (MFA) tentando recompor o Estado.
Tenentes e capitães faziam discursos afrontosos diante dos impávidos generais. Na tentativa de organizar uma autoridade básica, o líder rebelde Major Otelo Saraiva de Carvalho criou o COPCON, Comando Operacional do Continente, mas com o clima anarquista reinante passou a ser Como Organizar a PIDE com Outro Nome. Depois de ver sua autoridade se dissolver, o Major Otelo se lamentou: “Se eu tivesse lido os livros certos seria o Che Guevara da Europa”.
Os objetivos fundamentais do MFA se resumiram aos chamados “3 D”‘: Descolonização, Desenvolvimento e Democracia. O movimento dos capitães foi causado pela impossibilidade do exército português sustentar o esforço de guerra contra os grupos guerrilheiros de Angola, Guiné Bissau e Moçambique.
“Grândola, Vila Morena”, a música símbolo da revolução
O guitarrista Fernando Alvim recorda, na reedição de Cantigas do Maio: “A canção nasceu a 17 de maio de 1964, na viagem de regresso de Grândola”, vila do distrito de Setúbal, ao Sul de Lisboa, onde o cantor José Afonso ou simplesmente Zeca Afonso se tinha apresentado na Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense, na mesma noite que Carlos Paredes, coimbrão, um dos principais divulgadores da guitarra portuguesa e filiado ao Partido Comunista. “Ao volante do carro que também transportava Paredes e o seu acompanhante Alvim, inspirado pelo que tinha presenciado naquela noite, o Dr. José Afonso, como tinha sido apresentado na pequena vila alentejana, começou a dar corpo a «Grândola Vila Morena»: ele ia cantando ao volante até para não adormecer, depois começou a desenvolver a melodia e quando chegou ao fim da viagem a canção estava feita.”
Numa madrugada de outubro, se estenderam cabos da cabine do estúdio até o pátio exterior, com chão coberto por gravilha, um tipo de brita, para que José Mário, o guitarrista Carlos Correia, Zeca Afonso e Francisco Fanhais pudessem gravar os icônicos passos que marcam o arranque de «Grândola Vila Morena»: «aqueles passos que se ouvem no início não são de soldados, foram captados em estúdio numa espécie de encenação do tipo de ambiente criado pelos grupos corais alentejanos», esclarece Francisco Fanhais, cujas memórias da ocasião continuam nítidas. Foi esse o ambiente que o Zé Mário quis reproduzir.
Em Portugal, Zeca Afonso viu o regime silenciar as suas canções, mas «Grândola Vila Morena», curiosamente, não era visto como potencial hino subversivo e a 29 de março de 1974, menos de um mês antes da Revolução dos Cravos, o regime censório permitiu que o tema fosse interpretado no Primeiro Encontro da Canção Portuguesa, proibindo no entanto Zeca de dar voz a outros temas como «Venham Mais Cinco» ou «A Morte Saiu à Rua», evento produzido no Coliseu dos Recreios pela Casa da Imprensa e onde participaram nomes como Adriano Correia de Oliveira, Fausto, Vitorino, Carlos Paredes ou Manuel Freire. A multidão que acorreu ao Coliseu pressentiu a força da canção, que encerrou a noite.
A apresentação mais notória de «Grândola Vila Morena» começou na madrugada de 25 de Abril de 1974, quando passavam vinte minutos da zero hora: o Movimento das Forças Armadas escolheu a canção para senha da revolução, transmitindo-a da Rádio Renascença para confirmar que as operações estavam em marcha. A senha do movimento foi divulgada em quase todas as rádios logo em seguida.
https://www.youtube.com/watch?v=EWn7_aMsMH4
Grândola Vila Morena
José Afonso
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade
Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade
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