Para: Claudio Bento
Como a luz que perfura o vidro e se
Multiplica sobre a superfície adversa.
Os sons, quando passam por mim, tomam
Forma e sentido, apalavram-se, acendem
Como fósforos abruptos e vociferantes
E explodem fogos de artifício no cume
Da maravilhosa, insone noite de São João.
Ou levantam voo, foguetes na direção de
Marte ou Saturno, para depois pousarem em
Silêncio numa página qualquer em branco.
E ali, quietos e fugazes, selarem a paz
Com minha alma em chamas: fez-se um poema.
Que um dia, signos, receberam o batismo
Do nome das coisas e passaram a ser
O que lhes consumamos em etimologia.
Penetram pelos poros das longas frases
E é no espírito que habitam, cifrados.
Como luz, rasgam o penetrável universo
Até o instante em que nada mais haverá
Por testemunho de escritura e de fonema.
Adiantam-se ao meu passo, escrevem o que
Será o futuro, depois apenas nos ignoram
Como a sensação que me aflige quer falar
A todos que respiram. E faz-se um poema.
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