Clélia e Antônio mantinham, há anos, um casamento de fachada. O desejo, antes abundante, agora raras vezes os visitava. Por mais estranho que parecesse, ou por mais natural, dirão os pessimistas, Antônio já não desejava mais a sua mulher.
E não era pra menos: depois de ter dado à luz quatro filhos, Clélia já não era mais a mesma. Suas pernas ficaram repletas de celulites e varizes; os seios flácidos, caídos de tanto amamentar; a barriga completamente tomada de estrias. O que mais a deixava infeliz, no entanto, era saber que ninguém a desejava. Há tempos não sabia o que era levar uma cantada de outro homem; nem mesmo um furtivo olhar lhe era dirigido em tom de malícia.
Antônio, seu esposo, só tinha olhos para outras mulheres. Especialmente para as casadas. Não poupava elogios à esposa de Márcio, seu melhor amigo:
“Que mulher bonita a Adriana!”, dizia, “nem aparenta ter 40 anos: vendo assim, até parece que colocou silicone nos peitos, de tão duros. Que homem sortudo esse meu amigo”, completava, sem se dar conta de que um inocente comentário desses deixava Clélia ainda mais desapontada.
“Preciso fazer algo pra despertar o desejo de Antônio”, falava de si para si, às ocultas, quando teve uma idéia.
Pouco tempo depois começaram a chegar ao seu celular mensagens de um Admirador Secreto. Os torpedos chegavam, preferencialmente, quando Antônio estava em casa e, curiosamente, Clélia não fazia a menor questão de esconder do marido tais SMS, por mais picantes que pudessem ser. De maneira que, displicentemente deixava o celular à vista de Antônio para que ele ouvisse quando chegasse nova mensagem. Ela corria, pegava o celular e lia baixinho, porém não tão baixo o suficiente para seu marido não ouvir. Coisas do tipo: “adorei te ver na padaria… seu admirador secreto”. “gosto de quem gosta do lar”, “vc tá MARAVILHOSA”. “ pena que não é minha”, “hoje vc tava sem sutiã… DELICIA!”.
“O que tanto você olha nesse celular, mulher?”, perguntou Antônio certo dia.
“Nada não… tem um cara chato fazendo brincadeira comigo”, disse com ar de incomodada, olhando para o celular. Antonio não resistiu e o arrebatou de sua mão. Quando começou a ler as mensagens, não acreditou que tudo aquilo pudesse ser verdade: “Quer dizer que você agora deu pra me trair?”, perguntou furioso.
“Não, é claro que não”, respondeu Clélia, fingindo-se desconcertada. “Não imagino quem é o cara”.
“Pois a partir de amanhã quem compra pão nessa casa sou eu”, respondeu Antônio. “E quer saber mais? Eu já sei do que você está precisando”, disse enquanto arrastava Clélia para o quarto.
Uma semana depois, Clélia, feliz da vida, jogou fora o chip do “admirador secreto”.
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