A Guerra dos Emboabas – parte IV – As Preliminares e os Combates

Publicado por Padre Joao Delco Mesquita Penna 6 de agosto de 2021

As Preliminares

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À medida que aumentava a remessa de ouro para a metrópole, crescia também o número de forasteiros por toda a região das Minas. Assim, em 1698, após obter o perdão, Borba Gato assume o posto de lugar-tenente e em seguida, indicou algumas jazidas do metal precioso nos ribeiros e na serra de Sabará. Mais tarde, ascenderia ao posto de Tenente-general do Mato e Guarda-mor das Minas e foi responsável pela organização da justiça, divisão das lavras de ouro e o envio dos impostos que correspondiam à Coroa Portuguesa. Consta que Borba Gato era muito estimado pelos governadores de São Paulo, pois entregou várias permissões para exploração de minas, datas e lavras a amigos e parentes.

Sentindo-se ameaçados com a invasão cada vez maior de forasteiros, os paulistas procuraram garantir para si o controle e posse das minas, descontando o quinto ou 20%, reservado para a coroa. Como Portugal dependia deles, sinalizou num primeiro momento aceitar suas reivindicações. Mas essa política separou os mineradores em dois grupos, de um lado os paulistas, chefiados por Borba Gato e de outro os forasteiros cognominados pejorativamente “emboabas”, articulados em torno do português oriundo da Bahia Manuel Nunes Viana, que mantinham uma rota de comércio com a Bahia através da navegação do Rio São Francisco.

Entre os fatos que antecederam a Guerra dos Emboabas Borba Gato colocou a população do Arraial do Rio das Velhas, atual Sabará, contra o forasteiro Manuel Nunes Viana, radicado nos sopés da Serra da Piedade na vizinha Vila Nova da Rainha do Caeté. Inclusive, fez um “bando”, libelo oficial afixado nos prédios públicos, exigindo a retirada de Nunes Viana, principal líder “emboaba”, da região, alegando que ele havia praticado comércio ilegal de gado. O desentendimento entre os dois foi o estopim daquela que passou a ser conhecida como Guerra dos Emboabas que confrontaria bandeirantes e os recém-chegados nas Minas Gerais, adquirindo tal relevância que foi considerada “a primeira guerra civil das Américas” pelos historiadores Isaías Golgher e Varnhagen.

O primeiro confronto aconteceu em torno da cidade de Caeté, em outubro de 1708, quando dois paulistas tentaram tomar a arma de um forasteiro que se encontrava em frente a uma igreja. Manoel Nunes Viana, sabendo do ocorrido não aceitou o insulto e os desafiou para um duelo, que acabou não acontecendo porque logo pediram o restabelecimento da paz, ressaltando que cada um deveria cuidar de seus negócios.

A não ocorrência do duelo alvoroçou os indignados paulistas contra os reinóis, homens de origem portuguesa, que se diziam vitoriosos ante o recuo dos paulistas. Este acontecimento foi considerado vergonhoso e motivo da decisão de uma desforra. Mais tarde, um paulista assassinou um forasteiro e se refugiou, provocando a ira dos emboabas que prometeram vingança. Em um outro momento, em Morro Vermelho, Distrito de Caeté, o povo se reuniu para se organizar contra os paulistas e o resultado foi a aclamação de Manuel Nunes Viana como governador das Minas.

Em Sabará outro acontecimento chamou a atenção, quando um local foi incendiado pelos índios a mando dos emboabas em protesto contra os paulistas e contra o superintendente das Minas, Manuel de Borba Gato.

Os Combates

O melhor relato sobre a guerra dos emboabas saiu da pena do próprio Borba Gato, o seu primeiro historiador, que escreveu longamente ao governador dom Fernando Martins Mascarenhas Lencastre em 29 de novembro de 1708 das minas do Rio das Velhas, descrevendo os detalhes dos acontecimentos: “tumultos e dissensões paralisaram as Minas, extinguiram trabalho e anularam colheitas. Só se cuidava da guerra e os moradores estavam reduzidos à miséria”, documentos originais na Biblioteca Nacional de Lisboa, Arquivo de Marinha e Ultramar.

Em novembro de 1708 os paulistas foram expulsos de Sabará e se dirigem para Cachoeira do Campo, hoje distrito de Ouro Preto, onde procuraram se fortificar e buscar apoio de arraiais vizinhos. Nunes Viana à frente de um verdadeiro exército seguiu no encalço dos paulistas e recebeu grande apoio da população de emboabas, majoritários na região.

Os confrontos recomeçaram, e houve muitas mortes de paulistas porque as táticas dos emboabas eram melhores. A brutalidade dos combates, as ações implacáveis do Exército Emboaba provocou a insegurança no povo e fez Nunes Viana perder prestígio. Surge então a figura do frei Francisco de Meneses, um religioso e comerciante que lutava ferrenhamente contra o monopólio dos paulistas. Frei Francisco investiu-se de sua autoridade religiosa e sagrou Nunes Viana governador. Foi uma atitude ousada porque somente os reis eram sagrados com a bênção divina, e dessa forma o povo carente de um guia jurou fidelidade ao governador.

Bacalhau, distrito de Piranga, foi o local escolhido pelos paulistas para contra-atacar os emboabas como vingança da matança ocorrida em Cachoeira do Campo. Os moradores do Bacalhau, simpáticos aos paulistas, deixaram que os emboabas pernoitassem e, nesse tempo, formaram um grupo para “tocaiá-los” no retorno.

Os paulistas saíram vitoriosos nesta batalha planejada. Os historiadores mencionam que “a derrota foi total e sem piedade”. Tiradentes, antiga Ponta do Morro e São João Del Rei, antigo Arraial Novo, foram os locais onde os paulistas se reuniram para reagrupar suas forças com outros paulistas evadidos além de prisioneiros “perdoados” com a condição de saírem da região das Minas.

Foi feita uma emboscada com o objetivo de vingança contra os emboabas num capão ou mato nas imediações do Rio das Mortes. Os emboabas, ao chegar ao local perceberam o ardil dos paulistas e os surpreenderam, fazendo-lhes render as armas. Desarmados, os paulistas foram chacinados, ficando esse episódio conhecido como “Massacre do Capão da Traição, um acontecimento pérfido e sangrento”, conforme Barreiros, 1984, estima-se em trezentas mortes, mas o nome do rio é atribuído ao fato de que muitos morriam ao tentar atravessá-lo para fugir do pedágio do dono original do local, Tomé Del Rey.

O desfecho da Guerra foi abordado pelos memorialistas a partir da formação de um novo exército pelos paulistas “em defesa da pátria”. Um cerco no Arraial do Rio das Mortes foi feito para dar início aos ataques armados com a finalidade de ganhar terreno. Porém, os emboabas não responderam. Houve mortos e feridos, principalmente de emboabas.

Os paulistas insistiram em “lutar ou morrer” e os moradores emboabas queimaram as casas dos paulistas e a igreja do Arraial Novo. Para se prevenirem, os emboabas construíram duas fortificações, uma às margens do Rio das Mortes num local conhecido como Vargem Perto da Passagem, situado no Arraial de Matosinhos, atualmente um bairro popular de São João Del Rei, e outra no Arraial Novo, no Ribeiro do Lenheiro, para assegurar defesa contra as invasões.

Nesse mesmo tempo, a Capitania do Rio de Janeiro foi desmembrada, sendo criada, em 9 de novembro de 1709, a Capitania Unida de São Paulo e Minas Gerais do Ouro, tendo Antônio de Albuquerque como governador. Este episódio foi considerado como o encerramento da Guerra dos Emboabas por Vasconcelos, 1999, que também o aponta como início da reestruturação do território mineiro pela definição de leis e vilas. Golgher, 1984, discute que o final do conflito definiu a estrutura política, administrativa e social da futura Capitania de Minas Gerais, 1720-1821.

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