Hoje, dia 30 de abril de 2025 o jurista José Afonso da Silva completa nada menos que 100 anos, um século muito bem vivido. Para celebrar tiramos do fundo do baú um artigo que publicamos a seu respeito no dia 15/12/2009 no site metro.org.br. Transcrevemos aqui o corpo do artigo citado. Ao final indicaremos um link para um artigo recente escrito agora em homenagem ao seu centenário.
“Zico do Nereu
Meu primeiro contato consciente com o Dr. José Afonso da Silva foi ao chegar numa livraria onde vi o livro “Buritizal”, a história de Miguelão Capaégua. Só de folhear fiquei encantado com a obra e quis saber quem era aquele agradável autor.
Minha grande surpresa foi quando soube que se tratava do pompeano Zico do Nereu, mas a surpresa se tornou maior ainda quando me disseram que o mesmo era, de fato, o conhecido jurista e constitucionalista Dr. José Afonso da Silva, homem de confiança do ex-senador e depois governador de São Paulo Mário Covas. De 1995 a 1999 foi Secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, inovando ao incrementar a hegemonia da Justiça naquele órgão. Antes, na Constituinte de 1988, como chefe de gabinete do então senador, que foi nada menos que o relator da Constituinte, foi José Afonso quem teve a responsabilidade real de dar alinhavo à nossa atual constituição.
Já que autoestima pouca é bobagem, como mineiro de Pompéu quero dizer que tanto a constituição de 1937, a famosa “polaca”, quanto os Atos Institucionais de nºs 1 e 2, bem como extensos trechos da Constituição de 1967, tiveram a lavra de outro pompeano, o ex-ministro Francisco Luís da Silva Campos, o Chico Ciência, como era tratado de forma bem humorada pela grande mídia, ou Doutor Chiquinho, como era chamado lá em Pompéu. Explico, apesar de ter nascido em Dores do Indaiá, se tornou pompeano por opção, pois lá ele foi pioneiro na criação de gado zebu, em sua Fazenda do Indostão, e hoje dá seu nome ao distrito de Silva Campos, antigo Buritizal, de onde veio o Dr. José Afonso, se vocês me permitem a intimidade, o Zico do Nereu. Só que o Doutor Chiquinho deixou sua marca, liberal com os ricos e autoritário com os pobres, fortemente concentrador de poderes na União Federal em detrimento de estados e municípios. Já o Zico surgiu, dizem os videntes, para pagar o carma de Pompéu e Buritizal com o Brasil, emprestando seu espírito antiliberal e democrático, além de fortemente federalista e descentralizador de poderes e recursos.
Para escrever essa brilhante obra, não me refiro aqui à Constituição de 88, mas “Buritizal”, alguém o vira, durante alguns dias, lá em Pompéu, no armazém da Marlene, filha de um primo seu já falecido, coletando e validando informações sobre a História da cidade e os causos do distrito. Meus sobrinhos informaram-me isso por telefone, dizendo que se tratava do Zico do Nereu.
Zico era, segundo o Astrogildo e a Mirtes, meus sobrinhos e informantes, um garoto intrépido que, lá pelo fim da década de 1940, vivia ali pelas bandas do Buritizal, hoje distrito de Silva Campos, no município de Pompéu. O pai tinha lá suas posses suficientes pelo menos para manter a família e dar condições para que os filhos saíssem da roça para vencer na metrópole.
Morando na roça, dizem que só se alfabetizou com quinze anos de idade, o que no entanto ele desmente, dizendo que foi alfabetizado pela mãe, emigrou para São Paulo com a cara e a coragem junto com os irmãos, e certamente trabalhou muito para chegar ao topo do Direito Constitucional no Brasil. Foi lavrador, garimpeiro, alfaiate e oficial de justiça antes de se tornar bacharel em direito. José Afonso da Silva conseguiu graduação em Direito pela Universidade de São Paulo em 1957 obteve livre-docência em direito constitucional pela mesma universidade em 1969. Formado em Direito, esse notável pompeano decidiu que, além de atuar como advogado, deveria especializar-se no Direito Constitucional e ainda se dedicar a ministrar conhecimentos como professor. Foi Professor Titular da Faculdade de Direito da USP de 1975 a 1995. Tem diversos livros e artigos publicados sobre o tema, e é bem conhecido nas faculdades de direito. No corredor das faculdades é comum a expressão entre os estudantes: “me empresta o seu José Afonso?”.
Professor, elevou-se cada dia mais e passou a ser respeitado como o maior nome do Direito Constitucional no Brasil. Um grande professor, dono da Cátedra de Direito Constitucional, o menino humilde que saíra lá das redondezas do Buritizal ganhara respeito e admiração. Seus trabalhos sobre o difícil tema que é o Direito Constitucional são os mais complexos, completos e obrigatórios para quem deseja usar o título de advogado. São obras como COMENTÁRIO CONTEXTUAL À CONSTITUIÇÃO, talvez a mais ampla sobre o assunto.
Livros à disposição, leu tudo o que pode ler, estudou tudo sobre os meandros do Direito e das Leis. Fez amizades, ensinava com dedicação e aprimorava-se dia a dia. Voltava à sua terra geralmente para a festa de julho, mesmo quando era secretário de estado e principal assessor do relator da Constituinte. Ainda que pareça secundário, disseram-me de ouvir dizer que Zico era um jovem considerado bonito, um belo rapaz. A beleza que as pessoas vêem em nós é diretamente relacionada à nossa autoimagem, à nossa felicidade e ao nosso brilho interior. A beleza ideal e o padrão de beleza estão na nossa autoimagem que fará a cabeça de quem nos vê.
Nosso Jurista tornara-se um homem realizado
Chegava o tempo de ir rever sua terra com um novo olhar. Foi por isso que muita gente viu o Zico do Nereu, no fim da década passada, depois de ter enfrentado seus maiores desafios na vida pública, conversando pelas ruas de Pompéu, especialmente em Buritizal, digo Silva Campos, coletando e refinando seus dados com os mais velhos e conhecendo o que da terra sabem os mais jovens. Quem leu Guimarães Rosa, sabe que foi assim que também ele escrevera grande parte das melhores obras da nossa Literatura.
O Dr. José Afonso da Silva é uma pessoa que venceu barreiras imensas pelo mérito e pela pura força de vontade, o que vem a mostrar o milagre que a aplicação nos estudos pode fazer por uma pessoa. Por tudo o que foi e que ainda pode ser dito posso dizer com orgulho que este nosso conterrâneo de Minas Gerais e de Pompéu é uma pessoa realmente notável, por tudo o que fez não apenas no direito constitucional, mas pela grande figura humana que é.”
Veja também o artigo publicado por Clèmerson Merlin Clève em homenagem aos 100 anos do jurista pompeano:
https://www.conjur.com.br/2025-abr-12/o-professor-jose-afonso-da-silva-completa-100-anos/
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