Fernão de Magalhães – 500 anos da morte – parte II

Publicado por Padre Joao Delco Mesquita Penna 6 de abril de 2021

Fernão de Magalhães - 500 anos da morte – parte II

Uma coisa que não faltou nessa expedição foi a presença de cronistas, um total de seis, o mais conhecido deles foi o historiógrafo italiano Antônio de Pigafetta, 1480 ou 1491-1534. A viagem, como era de se esperar não foi nada fácil e, já no Atlântico, enfrentaram fortes tempestades e segundo Pigafetta, a tripulação foi salva graças às aparições de três santos, São Telmo, Santa Clara e São Nicolau. O fato curioso é que essa crença na aparição dos santos está ligada a dois fenômenos atmosféricos, chamados de fogos de santelmo e trombas marítimas, que sempre ocorriam no final das tempestades, e por isso eram atribuídos à proteção dos santos. Os primeiros eram devidos à energia estática das nuvens, que produzem halos de luz elétrica no alto dos mastros dos navios. O segundo fenômeno é um rápido ciclone, que eleva a água do mar por mais de cem metros, como se chovesse de baixo para cima.

Chegando à atual Baía de Guanabara no dia 5 de janeiro de 1520 imaginaram que poderia ser uma passagem interoceânica, mas logo viram seus limites. Aproveitarem para desfrutar a simpatia dos índios Tamoios e Tupinambás, a quem chamaram de “brasileiros”, dizendo terem feito vantajosas trocas, e daí continuaram rumo ao sul. Ao chegarem ao Rio da Prata pensaram que poderia ser a tão buscada passagem, até que perceberam ser o estuário de um grande rio. A partir daí, as tempestades começaram a atormentar a expedição, provocando o naufrágio da caravela Santiago. Pouco depois da parada de cinco meses de inverno, Magalhães enfrentou um violento motim, que o fez pensar em retornar à Espanha por duvidar de sua capacidade de conter os ânimos. Para contextualizar, Portugal e Espanha ou Castela eram as duas superpotências disputando a hegemonia dos mares do mundo. Tentem imaginar os capitães e padres castelhanos sob o comando de um capitão-general português. A tripulação da caravela San Antonio se amotinou, fez prisioneiro o capitão português Álvaro de Mesquita, primo de Magalhães, e iniciou uma viagem de volta com o piloto Estêvão Gomes, e na Espanha contaram horrores do capitão-general e dos portugueses que compunham seu Estado-maior. O mais grave é que a San Antonio era a maior das caravelas e tinha a maior quantidade de comida. Os demais capitães castelhanos, Luís de Mendoza e Gaspar de Quesada foram degolados na frente dos marujos depois de um julgamento sumário, enquanto o capitão Juan de Cartagena, que frequentemente desafiava a autoridade do comandante, teve outro castigo, foi abandonado numa pequena ilha na costa da Patagônia junto com seu insuflador, o sacerdote Pedro Sánchez de la Reina, depois de receberem um pequeno suprimento de biscoitos e de água potável do navio. Nenhum dos dois foi visto novamente.

Pouco depois de sufocar a insurreição, o capitão-general acabou de percorrer a região que chamou Patagônia, devido ao fato de seus nativos, os Tehuelches, gente brava, na língua mapudungun, serem encorpados, com grandes pés, e, por usarem calçados rústicos de couro, foram chamados por Pigafetta de “patacanes”, em italiano patas de cachorro.

O povo Tehuelche, habitantes originais da Patagônia

O povo Tehuelche, habitantes originais da Patagônia

Em 21 de outubro, dia de Santa Úrsula e das onze mil virgens, chegou ao Cabo do extremo sul do litoral atlântico do continente americano que foi denominado Cabo de las Vírgenes. A título de curiosidade turística, hoje este cabo é o marco Zero da Ruta 40 da Argentina com extensão de 5224 km indo até a divisa com a Bolívia, atravessando 20 parques nacionais, 18 importantes rios, 27 passagens na Cordilheira, e vai do nível do mar a alturas superiores a 5000 metros.

A expedição atingiu por fim em 1º de novembro de 1520, a tão sonhada passagem interoceânica, a extremidade sul do continente americano, e adentrou o estreito entre o continente e a Terra do Fogo que foi chamado por Magalhães de Estreito de Todos os Santos, mas depois foi rebatizado com seu nome. A Terra do Fogo foi batizada com esse nome, segundo a narrativa, porque à noite, no meio da intensa neblina viam se as luzes das fogueiras dos nativos. Também uma espécie de pinguim, descrita e desenhada pelos cronistas da viagem, ainda não conhecida dos europeus, ficou denominada Pinguim de Magalhães.

Depois de vencer o mar agitado do Estreito, ainda em novembro, a nau-capitânia Trinidad seguida das três caravelas remanescentes, Concepción, Santiago e Victória alcançaram o oceano aberto, que depois de tanta tempestade lhes pareceu pacífico e Pacífico ficou sendo. Foi aí que a tripulação começou a adoecer, principalmente com o escorbuto que é uma avitaminose, devido à escassez de alimentos frescos. Uns atribuíram tais desgraças às pragas rogadas pelo padre Pedro Sánchez. A água potável era racionada e a alimentação à base de bolachas, cujo estado de conservação era deplorável, depois de percorrer parte da costa do que é hoje o Chile, iniciou-se a grande travessia do Pacífico, que certamente era MUUUUUIIIITO maior que os europeus conseguiram imaginar!

Astronomia

Mas nem só os infortúnios merecem ser lembrados. Na mansidão das águas do Oceano Pacífico, às noites o céu era extraordinariamente límpido e as cartas astronômicas feitas para o céu do hemisfério norte de pouco serviam. Em compensação os viajantes tiveram o deslumbre de enxergar a olho nu duas galáxias vizinhas da nossa Via Láctea. Hoje sabe-se que nossa galáxia faz parte de um “Grupo Local”, composto por Andrômeda, a maior de todas, a galáxia do Triângulo, a Grande Nuvem de Magalhães e a Pequena Nuvem de Magalhães. A expressão Nuvem prevaleceu por ter sido usada por Magalhães, mas trata-se de duas galáxias uma maior, mas vinte vezes menor que a Via Láctea, e com dez vezes menos estrelas, e a Pequena Nuvem que é menor ainda, ambas se situam a 160 mil anos luz da Terra. Mas a principal área impactada por Fernão de Magalhães foi mesmo a História. Durante uma conferência, o cientista da NASA Alan Stern, líder da missão New Horizons, descreve as navegações do português como um ponto de virada na história, tão singular quanto a primeira viagem tripulada ao espaço feita pelo russo Yuri Gagárin em 1961 e o primeiro pouso na Lua feito em 1969 pelos americanos Armstrong, Aldrin Jr e Collins.

Comentários
  • João Delço Mesquita Penna 1083 dias atrás

    Paulo! Boas horas! Obrigado pela observação!Você realmente tem razão nas duas observações! A Caravela Santigo havia naufragado na costa da atual patagônia Argentina. realmente ao atravessar o estreito e hegar no chamado Mare Pacificum a esquadra não se interessou em pesquisar a costa ocidental do continente se dirigindo diretamente para o objetivo final que era as ilhas da molucas, muito bem observado! obrigado!

Deixe um comentário

banner

Fundação Metro

Clique Aqui!