Lúcifer, a Reforma Protestante e a Teologia da Prosperidade – parte VII

Publicado por Editor 27 de setembro de 2022

RecNov Record Novelas, Zona Oeste - Rio de Janeiro
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(Continuação da parte VI)

O televangelismo no Brasil

No Brasil, o televangelismo começou a ganhar destaque em 1990, quando a Rede Record foi comprada por Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus. Macedo e outros dirigentes pentecostais começaram exibindo programas religiosos durante a madrugada e em horários alugados em redes deficitárias como a Bandeirantes. Em 1995, causou polêmica ao exibir um discurso do “bispo” Sérgio von Helde contra o feriado de Nossa Senhora Aparecida no qual ele chutou uma imagem da santa várias vezes.

Macedo já vendeu mais de 10 milhões de livros e é dono da Rede Record, uma das três maiores emissoras de televisão do Brasil, do jornal gratuito Folha Universal, cuja circulação chega a 2,5 milhões de exemplares e do canal de notícias Record News.

Segundo dados do censo de 2010, a maioria dos seguidores do movimento pentecostal no Brasil, onde estão incluídos os seguidores das igrejas que professam a doutrina da prosperidade, são mulheres, residentes de áreas urbanas, de 30 a 49 anos de idade, de cor parda, com ensino fundamental incompleto e com rendimento médio de até três salários mínimos. Ainda de acordo com o censo, 45% dos fiéis dessas igrejas são economicamente inativos, mas é difícil precisar as estatísticas.

Divinização da Assistência Social

No Brasil o Instituto Ressoar, ligado à Igreja Universal do Reino de Deus atua aplicando incentivos de Imposto de Renda da Rede Record de TV e outras empresas do grupo que, ao contrário dos templos, não é isenta do tributo. Essa se torna simplesmente uma forma de chegar nas periferias carentes dos grandes centros urbanos e angariar mais seguidores para a religião. No dia 31/07/2022, na inauguração do suntuoso megatemplo Solo Sagrado, em Taguatinga, cidade satélite do Distrito Federal, que contou com a presença do presidente Jair Bolsonaro, Cristiane Britto, que substituiu Damares Alves no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, afirmou: “a Igreja Universal chega onde nenhum governo chega: nos vulneráveis”.

Paralelamente a tais programas, as igrejas defendem a capacitação e o florescimento humano com o objetivo de libertar as pessoas do “assistencialismo” e da “mentalidade de vítima”, ou seja, não querem concorrência com as políticas governamentais, mas capturar a Assistência Social em suas mãos ungidas por Deus.

Crescimento internacional

Em 2006, três das quatro maiores congregações dos Estados Unidos seguiam tal doutrina. A maioria dos fiéis é oriunda do Cinturão do Sol, que se estende da Califórnia até a Flórida passando pelo Texas e Meio Oeste, toda a faixa sul do país, região mais próspera dos EUA pela saturação e declínio do Nordeste.

No final da década de 2000, seus seguidores afirmavam que dezenas de milhões de cristãos a haviam adotado naquele país. Uma pesquisa conduzida em 2006 pela revista Time informava que 17% dos cristãos estadunidenses se identificavam com o movimento. Houve certa vez uma iniciativa no Senado dos EUA de fiscalizar o grande volume de dinheiro nessas igrejas, mas ao final recuaram, intimidados por sua força política.

Paralelamente, o crescimento dessas igrejas foi notável no Terceiro Mundo nos primeiros anos do milênio. Uma região que presenciou o crescimento explosivo foi a África Ocidental, em especial Nigéria e Camarões. Segundo Philip Jenkins, da Universidade Estadual da Pensilvânia, cidadãos pobres de países pobres acham a doutrina atraente por causa de sua impotência econômica e a esperança nos milagres financeiros. Para Rowan Moore Gerety, na África a “memória da antipatia marxista à religião” durante as lutas pela descolonização e do “catolicismo paternalista do estado colonial” permitiu que igrejas seguidoras da teologia da prosperidade encontrassem um povo “aberto a uma nova forma de expressão religiosa”.

No início dos anos 1990 a Igreja Universal do Reino de Deus se expandiu nos Países Africanos de língua portuguesa. Em Moçambique, apesar de diversas críticas, ela conta com apoio de diversos membros do governo local, tendo comprado a TV Miramar, principal emissora privada do país. Em Angola, reivindica ter mais de 400 mil fiéis, mas suas atividades foram suspensas pelas autoridades pelo período de 2 meses, devido a um tumulto no final de 2013, em que 16 pessoas morreram pisoteadas. Depois disso tem encontrado resistências naquele país, e recorreram ao presidente Jair Bolsonaro para interceder a seu favor via relação entre governos.

Outra igreja neopentecostal, a Igreja Maná, de origem portuguesa, foi expulsa de Angola após acusações de desvio de fundos doados pela petrolífera Sonangol para a construção de uma escola.

A doutrina também forçou mudanças na Igreja Católica para impedir a debandada de fiéis. Segundo Lucelmo Lacerda a Renovação Carismática no Brasil “sofre um processo de neopentecostalização”, embora reconheça que o movimento católico possua termos e enfoques um pouco diferentes. Nas Filipinas, o movimento El Shaddai, parte da Renovação Carismática, espalhou os ensinamentos da doutrina para fora do cristianismo protestante. Já na Ásia, a Igreja do Evangelho Pleno, sediada em Seul, ganhou atenção na década de 1990 após alegar que tem a maior congregação do mundo.

Nos Estados Unidos, o movimento tem atraído mais recentemente muitos seguidores na classe média e é mais popular em cidades-dormitório, entre imigrantes e áreas suburbanas. As explicações para esse sucesso são o desdém da sociedade americana pela possibilidade de ascenção social dos mais pobres, o otimismo econômico do país entre as décadas de 1950 e 1990, a chamada Doutrina do Destino Manifesto, crença do século XIX segundo a qual o povo estadunidense foi escolhido por Deus para guiar o Ocidente. Marvin Harris diz que o foco da doutrina no mundo material é uma resposta à secularização da religião nos Estados Unidos. Ele a vê como uma tentativa de realização do Sonho Americano através do poder sobrenatural.

Comparações com outros movimentos

O historiador Carter Lindberg, da Universidade de Boston, traçou paralelos entre a teologia da prosperidade contemporânea e o comércio de indulgências conduzido pela Igreja Católica durante a Idade Média.

Na África, a utilização de óleos abençoados e outras formas de tratamentos espirituais usadas pela Igreja Universal do Reino de Deus são semelhantes às mandingas típicas das religiões africanas, ao mesmo tempo que os rituais africanos são chamados por ela de “feitiçaria” e até demoníacos.

Alguns veem a doutrina roubando espaço da Teologia da Libertação na América Latina, visto que ambas focam nos desfavorecidos, a última através de mudanças no sistema político e a primeira pelo sucesso individual.

(Continua na parte VIII)

Lúcifer, a Reforma Protestante e a Teologia da Prosperidade – parte VIII

Comentários
  • Maria Silvia 569 dias atrás

    Excelentes os artigos publicados sobre Lúcifer, a Reforma Protestante e a Teologia da Prosperidade.
    Descrição clara sobre o desenvolvimento e a disseminação dessa doutrina, seguida por milhões de adeptos em todo o mundo,da sociedade atual.

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