Abuso Sexual: Infância e Adolescência

Publicado por Carlos Bitencourt Almeida 30 de janeiro de 2012

 

Há uma violência da qual crianças e adolescentes podem ser vítimas, que, num certo sentido, é pior do que a violência explícita do espancamento e do estupro. A violência manifesta deixa marcas no corpo. A pessoa pode ser denunciada, outros percebem. O estupro pode ser diagnosticado por um médico ginecologista. Porém existem abusadores inteligentes que não deixam marcas, não deixam pistas, se denunciados não há provas contra eles. Os processos podem dar em nada.

Ouvi muitas histórias em muitos anos de profissão. São adultos que falam do que sofreram há 10 ou 20 anos. Muitas vezes ninguém nunca soube, ou apenas anos após os fatos transcorridos. Não é difícil emudecer uma criança pequena. Até 8 ou 9 anos, com freqüência tem pouca autodefesa.

1. Duas irmãs, entre 7 e 9 anos, em separado, são levadas para visitar os avós. O avô despe a menina, coloca-a em seu colo e acaricia-lhe o corpo. A avó sabe e cala. As visitas se repetem muitas vezes. Até que já um pouco mais crescida a criança adquire coragem e firmeza para dizer não, para recusar as visitas. Os pais nunca souberam. Quem suspeitaria dos próprios pais? Já adultas as jovens conversam entre si e descobrem que foram vítimas na mesma época.

2. A menina é levada para visitar o tio querido de toda família, o homem bom, acima de qualquer suspeita. Ele a presenteia, cuida com carinho, leva para passear, e a despe e a acaricia por todo o corpo, inclusive os genitais. A criança vive a tensão dolorosa de sentir aversão e prazer. As visitas se repetem muitas vezes até que a criança consegue recusar as visitas. Ninguém da família nunca soube. Apenas quando adulta comenta com o marido.

3. O padrasto, noite alta, faz visitas ao quarto da enteada de 13 anos. A mãe não permite que ela tranque a porta do quarto para dormir. Todos dormem com as portas destrancadas. Ele acaricia-lhe o corpo por dentro da roupa e os genitais. A jovem não consegue dizer não, não consegue falar com ninguém. Sua relação com a mãe não é boa. O padrasto é homem de excelente reputação, sem vícios, considerado por todos honesto, responsável, inteligente, íntegro. As visitas duram anos. A jovem o interpela um dia, durante o período diurno, já sendo maior de idade. Ele se justifica: ”Sou doente.” Por fim ela muda-se para outra cidade e vai viver longe.

4. Um menino de 9 anos fica amigo de um homem adulto muito gentil com crianças do sexo masculino. Faz brinquedos para elas, leva-as para passear, conquista a confiança dos pais e as leva em pequenas viagens a fazendas nas redondezas. Após um destes passeios, à noite, na carroceria de um caminhão em movimento, ele acaricia as coxas nuas do menino. Este acha estranho e ele se justifica:  ‘Porque não, eu sou teu maior amigo.’ A criança consegue afastar-se e não sai mais com ele. Ninguém jamais soube do fato.

5. A mãe quando precisa ausentar-se deixa a filha entre 6 e 9 anos aos cuidados do seu sobrinho predileto, em quem confia. Numa casa grande, deserta, em absoluto silêncio, no escuro total, a criança é estuprada muitas vezes ao longo dos anos. Relações anais. Ninguém nunca soube. Com o tempo a criança consegue recusar-se a ficar no local. Continua conviver com o criminoso, mas nunca o denunciou, mesmo depois de adulta. Ele permanece desfrutando de ótima reputação na família e fora dela.

A reação de cada criança ou adulto ao trauma, seja de origem sexual ou de qualquer outro tipo, é sempre individual. Há mulheres abusadas na infância ou adolescência, mesmo se vítimas de estupro, que conseguem se refazerem e terem uma vida sexual  plena, livre e normal. Outras, embora consigam viver sexualmente em plenitude, têm na memória do estupro ou abuso uma ferida permanente que arde na solidão, lateja, pulsa de tempos em tempos, desvitalizando, enchendo a alma de tristeza. E existem mulheres que jamais se recuperam. Têm medo dos homens. Buscam vida sexual, não desejam a solidão, mas o medo invade o envolvimento. Nunca relaxam totalmente. Lembram com freqüência os traumas sofridos há anos, na hora em que estão com a pessoa que amam e desejam. Desenvolvem um padrão doentio, doloroso, uma chaga aberta que do passado invade a vida no presente de cada envolvimento erótico e sexual.

Comentários
  • Angelo 2991 dias atrás

    Eu tenho 33 anos hoje. Mas desde os 5 anos de idade que eu era abusado sexualmente por caras mais velhos dos quais o meu pai devia dinheiro para eles e eles diziam que a forma que tinha do meu pai pagar era me estuprando, eu fui violentado várias vezes, eu morava longe na zona rural e sempre que saia da escola no turno vespertino na sede da cidade eles me atacavam no caminho. Certa vez eles me machucaram tanto que eu tive hemorragia por quase 2 dias. Eu tentei contar para os meus pais, mas eles não acreditavam. Eu apanhei muito do meu pai por causa disso, ele me achava um fraco, me batia muito. Ele era violento e abusivo.

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