Solidão sitiada

Publicado por Antonio Ângelo 15 de maio de 2020

Solidão sitiada

fique em casa
olhe pela janela
na parede do prédio ao lado
descubra manchas amorfas
figurações
um rosto de velho
um borrão
ilegíveis pichações
abaixo no pátio
mendiga curvada sobre o lixo
seguida por um cão

depois olhe para dentro
para o espelho
os vincos em torno à boca
cabelos encanecidos
para os pés
os disformes joelhos
que há muito não se dobram
ante o deus esfacelado

não fique em casa
em direção qualquer na avenida deserta
ultrapasse as transversais
desconheça os sinais
sempre em frente
até que numa esquina
sob a marquise
a estática mulher o convide
para suscitar gozos
em suspeita pensão
onde num quarto mal iluminado
entre paroxismos
espasmos e secreções
o desastre se prenuncia
orgasmo desembocando
em agonia febre equimoses
asfixia inanição
necrose liquefazendo alvéolos
em pútrida consumpção

Comentários
  • wesley 1410 dias atrás

    Mas que danação, AA. Se ficar em casa não é o sossego do crente, tampouco sair de casa parecerá prêmio ao cruzado. Que dilema! Mas que belo poema.

  • aminthas 1411 dias atrás

    Meu amigo. Que alegria em meio a solidão que vivemos. Solidão sitiada , vai bem fundo do que me resta. Grande abraço fraterno e aos seus

  • Abel Câmara 1413 dias atrás

    Realismo magico, esgrima de palavras que lampejam fulminantes na metrœpole furtiva

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