Microcefalia: a fuga dos pais

Publicado por Antonio Carlos Santini 6 de maio de 2016

fuga dos pais

O surgimento de casos de microcefalia tem sido motivo de separação para casais, quando maridos recusam a criança e abandonam as esposas. No entanto, essas crianças nos convocam para atitudes de solidariedade.

Matéria publicada pelo jornal “Estado de São Paulo” em 4/02/2016, assinada por Felipe Resk, relata que casamentos têm sido desfeitos em Pernambuco ainda durante a gravidez, ou após o nascimento de crianças com microcefalia, devido à recusa do pai em aceitar o filho. Como pano de fundo, sentimentos de culpa e de fracasso, ou a transferência da culpa para a esposa.

Segundo a reportagem, em Pernambuco, o Estado que tem apresentado o maior número de notificações de microcefalia, muitas mães têm sido abandonadas pelos companheiros após descobrir que o filho do casal é portador da má-formação. Médicos relatam que os casos são cada vez mais frequentes e afetam principalmente jovens em relações instáveis, mas acontece também em casamentos com mais tempo de duração. A maior dificuldade na aceitação da criança malformada ocorre justamente com o pai.

Um pediatra, que preferiu permanecer anônimo, declarou: “Eu me surpreendi com a quantidade de mães que estão cuidando dos filhos sozinhas, porque o pai simplesmente resolveu largar a família”. Uma das mães, 32 anos de idade, 3 filhos, abandonada ainda na maternidade, declarou: “Ele me culpou por ela nascer assim. Disse que a menina era doente porque eu era uma pessoa ruim.”

Acolher a vida

O “Compêndio da Doutrina Social da Igreja”, publicado pelo Pontifício Conselho “Justiça e Paz” (Ed. Paulinas, 2005), traz a visão da Igreja sobre a situação das pessoas com deficiência:

“As pessoas deficientes são sujeitos plenamente humanos, titulares de direitos e deveres. Apesar das limitações e dos sofrimentos inscritos no seu corpo e nas suas faculdades, põem mais em relevo a dignidade e a grandeza do homem. Dado que a pessoa deficiente é um sujeito com todos os seus direitos, ele deve ser ajudada a participar na vida familiar e social em todas as suas dimensões e em todos os níveis acessíveis às suas possibilidades”, CDSI, 148.

E ainda: “É necessário promover, com medidas eficazes e apropriadas, os direitos da pessoa deficiente. Seria radicalmente indigno do homem e seria uma negação da humanidade comum admitir à vida da sociedade, e portanto ao trabalho, só os membros na plena posse das funções do seu ser, porque, procedendo desse modo, recair-se-ia numa forma grave de discriminação, a dos fortes e sãos contra os fracos e doentes.”

A pessoa com deficiências, acrescenta o texto, “também ela precisa amar e ser amada, precisa de ternura, de proximidade, de intimidade, segundo as próprias possibilidades e no respeito da ordem moral, que é a mesma para os sãos e para os que têm uma deficiência”.

Juntas para amar

Enquanto os pais se ausentam, as mães de crianças com microcefalia começam a se organizar, formando grupos de ajuda mútua, trocando suas experiências e apoiando-se umas às outras. Também as instituições da sociedade manifestam os primeiros sinais de atenção para essas mães.

A Agência Brasil informa que a cidade da Salvador, BA, conta com serviço de apoio a crianças com microcefalia. O Instituto Bahiano de Reabilitação – IBR, entidade filantrópica com 60 anos de atuação e especializada no atendimento às pessoas com deficiências neuromotoras, oferece ajuda a famílias que necessitam de acompanhamento.

Um grupo de atenção às famílias de crianças com microcefalia foi criado no local. Professora do bairro Nordeste de Amaralina, na periferia de Salvador, Sílvia diz que a orientação dos profissionais vai ajudá-la a estimular o desenvolvimento da filha.

“Aqui tenho toda a assistência e começamos a participar do grupo com outras crianças. As expectativas são maravilhosas, sempre com muito otimismo, a certeza de que o bebê vai se desenvolver, e sabendo que as pessoas estão aqui para ajudar com isso”, diz a mãe da menina, que recebeu atendimento do Instituto antes mesmo da formação do grupo.

No livro “Identidade e Estatuto do Embrião Humano”, CCFC/EDUSC, 2005, os autores Juan de Dios V. Correa e Elio Sgreccia comentam: “Não desejamos suprimir ou minimizar as dificuldades e ansiedades que uma vida malformada, a consciência de todo o sofrimento que ela trará consigo, provocarão para a mãe, os parentes e a família. Pois a geração e o nascimento de um bebê não só constituem um acontecimento que interessa à mãe e à família, mas têm também uma dimensão social e comunitária, que convoca a todos para uma atitude de solidariedade, em razão de sua existência e necessidade. Significa isso que uma nova vida que seja deficiente ou incapacitada é um apelo a uma solidariedade mais intensa e comprometida”.

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