XXXVIII – Sossega Leão!

Publicado por Bill Braga 22 de junho de 2017
sossega leão

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Assim que cheguei a BH toda a família já estava preocupada, se eu teria surtado, o que era aquele chá que tomei, que besteiras eu teria feito. Não me lembro muito bem do desencadear dos fatos, mas de algumas imagens fragmentadas de tudo que ocorreu naquele dia cabalístico da abertura de uma nova dimensão para nós terráqueos. O dia 21/12/2012 foi o dia em que encontrei com a Daniela e nos meios místicos era considerado o dia da abertura de um grande portal que despertaria as consciências adormecidas, inaugurando a Nova Era, de pleno Amor incondicional.

Depois de resolvidos todos os perrengues com o carro, peguei a estrada com minhas músicas de companhia e acelerando. Cheguei em BH no dia do Natal, toda família me esperava com medo de como eu chegaria, já que eles pressupunham que eu estava surtado. Na realidade sentia-me muito bem e confiante, cada música me dava um novo ensinamento, e eu estava em paz, apesar de múltiplas conexões sinápticas simultâneas, levando meu pensamento a um nível de aceleração genial.

Em minha cabeça nada poderia dar errado, eu estava iluminado, conectado com a Força que rege o Universo, como eles poderiam fazer algo mau, ou me internar se eu me sentia como Jesus ou Buda. O fato é que muito do que se passava comigo se situava numa linha tênue entre a psicose e a iluminação espiritual. E como minha mãe é médica e não acredita no xamanismo e na iluminação, certamente eu corria o risco de ser interpretado de forma equivocada e ser dado como louco, já que havia um diagnóstico de bipolaridade, ainda que não houvessem exames ou psicodiagnósticos que comprovassem tal fato. Somente o histórico.

Cheguei e fui para minha casa. Encontrei minha mãe e meus irmãos que olhavam para mim com certa desconfiança e sobre minha ex-namorada sempre perguntavam: – E a Natália o que você vai falar para ela? Eu disse: tudo, não mentirei e contarei a ela toda a ventura que vivi ao lado de Daniela, que já era apaixonado por ela antes de conhecer Natalia e enfim, vou ser sincero.

Fomos para a celebração de Natal na casa da minha finada Vó Myriam. A família toda presente, estavam todos alegres por eu ter voltado bem, talvez desconfiados por eu estar bem demais, alguns curiosos sobre o tal chá, a ayahuasca que eu havia tomado. A festa de Natal seguiu normal, eu bastante comunicativo e trocando energias com todos os primos e primas, tentando tranquilizar a todos que eu não tinha voltado louco.

De lá fui para a festa de Natal da família do meu pai, no Bairro Santa Tereza, na casa da minha Vó Nenê. Essa festa foi mágica. Me senti conectado com todos. Parece que ali o ambiente era mais propício às energias abertas e fui cumprimentando todos com um selinho, um toque de lábios. Na minha cabeça era como se eu estivesse distribuindo energias curativas pela boca. Ali houve muita música, toquei violão, gaita, me integrei plenamente e achei que ali era a família que me compreenderia. Foi surreal, mágico e transcendental ao mesmo tempo.

Quando cheguei conversei por telefone com a Natália. Ela era um anjinho, no seu jeito simples e amoroso falou que queria conversar comigo, entender tudo que se passava e resolver como ficaríamos no futuro. Eu ainda com a memória fresca das relações que tive com a Daniela, e o lembrete da frase que ela me disse: – Vou te ajudar a ter tudo o que você quiser na vida. Seria Daniela Lúcifer?, e eu teria feito um pacto com o Diabo? Não sei, … era grande a confusão na minha mente diante de tantas novas informações. Deixei para encontrar Natália no dia seguinte. Saí da festa na casa da minha avó Marlene, sentindo como se todas as rezas e energias fossem direcionadas a mim, sim, eu pensava que era Jesus, e que aquela comemoração era para celebrar meu renascimento. Na verdade é comum nas psicoses o sujeito acreditar ter sido Jesus, Buda ou Krishna, dependendo do condicionamento cultural. Aprendi posteriormente que Todos Somos Jesus, Buda, Krishna, num sentido de que carregamos em nós a potencialidade de manifestar o Amor Puro que esses arquétipos representam. Mas para uma sociedade desencantada, você dizer eu sou Jesus, certamente vai ser considerado louco, a não ser que consiga efetuar algum milagre. He he …

Voltei para minha casa, dormi pouco porque estava muito conectado. Não me lembro do dia seguinte. Sei que conversei com Natália, lembro dela dizer que eu não podia fazer aquilo de fugir porque tinha muita gente que me amava, que ficava preocupada com minha sanidade. Eu nem ligava, poderia me perder no mundo, poderia virar mendigo, mas aquela sensação de êxtase, de conexão profunda com o universo era a maior aspiração que alguém poderia ter na vida. Seria isso a tal iluminação? Ou seria apenas uma mania de um bipolar? Se fosse, acho que eu seria multipolar. Esses diagnósticos psiquiátricos são uma grande furada já que tudo que é considerado doença por eles é um caminho para um despertar espiritual, como eu iria aprender posteriormente na comunidade Alma Bipolar.

Lembro também que meu pai me pegou em casa e demos várias voltas de carro pela cidade, ele me falando das preocupações familiares e eu dizendo que estava tudo bem, que eu tinha entendido tudo, que a ayahuasca havia me mostrado que pra descobrir meu caminho eu tinha que me perder no caminho. Tem isso em vários livros do Novo Testamento, “Todo aquele que quer salvar sua vida pode perdê-la, e só aquele que aceita perdê-la pode salvá-la”. Ou seja, entrega, aceitação e deixar a Força me guiar. Tudo muito confuso para meu pai, um ateu, e minha mãe, uma médica inclinada pro espiritismo. Eu falava uma língua que eles não compreendiam.

Minha agitação foi ficando mais intensa e eles não queriam deixar eu sair de casa, então comecei a ficar agressivo. Daí o surto tomou conta. Eles não aguentaram, e lá me veio a solução dos fracos: internação. Poucos dias depois de voltar de São Thomé fui internado novamente, nem sei se na Pinel ou no Santa Maria. Novamente considerado louco, fui aprisionado e me deram doses cavalares de sedativos e antipsicóticos para acalmar minha mente. Jesus foi crucificado por aqueles que anunciavam sua vinda, os judeus, seria eu crucificado por aqueles que mais me amavam, minha família?

Comentários
  • Bruno 2497 dias atrás

    Bill, gostei muito de ler seus artigos, já li todos. Fiquei curioso em saber porque você, mesmo sabendo que corria o risco de ser internado voltou para a casa da familia. Minha curiosidade é se você depende deles financeiramente ou tem sua própria renda.

    • bill 2497 dias atrás

      Oi Bruno,

      que bom que gostou, é muito bom ter tua companhia nesses escritos. Na realidade eu tinha meu emprego, mas ainda dependia financeiramente da minha mãe. Havia também uma dependência psíquica. Um laço afetivo forte. Por isso voltava. Mas é preciso ter um canto nosso, pra podermos viver nossas próprias loucuras não é?
      Um abraço

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